Friends are not FOOD

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sábado, 13 de dezembro de 2014

O Jardim da Vida


Pedro e Leonel  vagavam pela terra  morta quando avistaram algo de cor   rosa que destoava em toda  aquele cinzento de destruição. Aproximaram se e a cada passo a esperança pulsava mais forte dentro deles. Os dois estupefatos constataram que uma morada, um Oasis, no fundo de uma rua permanecia intacta: A grama verde, gatos e cães brincavam pelo pátio, pássaros de todas as cores e penugens, gorjeavam  nas árvores. O chafariz na frente da casa era  cercado de folhagens. Uma mulher de mármore com curvas perfeitas tinha o rosto virado para o céu  e  num banho ininterrupto, ficava ali, apontando para cima. Um musgo verde tornava o seu cabelo ainda mais volumoso e espesso. Um limo mais claro dava a estatua uma transparência etérea. Mesmo de longe via-se o esgar de quem  esbanjava água enquanto a sede imperava lá fora
Buganvílias cor de rosa entrelaçavam-se com a grade grossa de ferro que separava aquela residência da rua. Seus espinhos se tornaram verdadeiros escudos impossibilitando a entrada de qualquer um.
Tentaram entrar, não conseguiam ultrapassar a grade sem conseguir aonde se apoiar. O portão emperrado, nem cinco homens conseguiriam move-lo.  Chamaram, gritaram por socorro. O silencio sepulcral, era cortado pelos clamores dos dois que caminhavam de um lado a outro da grade tentando entrar.  Não havia uma alma viva ali. Permaneceram até o  anoitecer na esperança de aparecer alguém e abrir aquela fortaleza,  quando  uma  mulher  surgiu e começou a regar as plantas. Ela ficou minutos aguando e conversando com   cada folhagem, com cada planta. Despedia-se ao parar e cumprimentava a próxima ao começar. De longe viu-se escorrer o liquido que o chão bebeu. Sujos, sedentos, os dois homens ansiavam por água mais ainda que a terra seca. Cabelos compridos, desgrenhados a pele escura curtida pelo sol, vestidos em farrapos. Precisavam beber  e  por alguns goles   seriam capazes de tudo.
Pedro e Leonel  tinham mulher que esperavam por auxilio. Não teria como chegar  em casa  mais uma vez com as  mãos vazias. O único filho de Leonel estava desidratado. O leite de Ester, há dias sem alimentação, secara e temiam pela sua vida.
 A jardineira não os escutava por mais alto que gritassem. Seu cabelo era preso e usava um vestido claro e solto no corpo. Tentaram chamar a atenção dos cães, atirando pedrinhas e pedaços de galhos que nunca atravessavam a grade ou alcançavam o chão. Ninguém os percebia.
Leonel caminhava de um lado para o outro procurando uma abertura. Como nada encontrou, começou a escalar a grade, mas os espinhos das buganvílias agarraram suas pernas, adentraram sua  carne de onde não verteu sangue. Nada o faria parar, tamanha era a sua ânsia de levar água para a mulher e  filho.
Observando tudo do outro lado da grade, aos poucos Pedro percebeu brotarem raízes dos pés de Leonel. Essas  logo se infiltraram no chão. De seus ouvidos, narinas e boca surgiram galhos florescidos. No rosto do homem que observava via se todo o horror que o consumia enquanto o corpo do amigo, seus membros se transformavam em mais uma buganvília a reforçar a grade. Os olhos do homem que tentara adentrar aquele paraíso caíram empurrados por galhos internos que surgiam cada vez mais fortes. Pedro afastou-se  temendo que aquilo também ocorresse com ele. 
Logo a mulher veio regar a nova buganvília que sedenta estremeceu ao receber as primeiras gotas. Ela sabia de sua sede. Chamando Leonel pelo nome, regou-o por mais tempo que as plantas anteriores. Do lado de fora, Pedro despercebido, engoliu em seco  e levou às mãos a cabeça pensando que aquilo era um pesadelo. Pediu água num gemido, mas ela não o ouviu. Tonto, trocando as pernas, começou a retornar pra casa. O que diria a Ester, mulher de Leonel, quando chegasse?
No caminho, ninguém. Seus pés estalavam pisando os galhos secos e torrões de terra. Há tempos que sabia que eram os únicos. Onde tinham ido e quando  não saberia dizer. Uma tontura estranha  tomava conta dele que temia  tornar-se uma planta  ali mesmo, embora  não sobrevivesse  no chão seco.
Em casa, Marta sua mulher chorava sem lagrimas. O choro aumentou quando percebeu que ele chegara de mãos vazias. Abraçou-o  triste e entre  soluços secos  disse estar grávida. O chão girou e ele  quase desfaleceu. O que ele faria agora? Ester, mulher de Leonel, veio do quartinho com olhos inchados e o bebe quase imóvel no colo. Não teve coragem de dizer nada. Passou a mão pelo cabelo desgrenhado e duro e sem olhar nos olhos delas, inventou qualquer coisa, quando perguntaram por Leonel.  Rápido sem detalhes, virado de costas, fingindo estar tirando um espinho do pé, disse que  teria que sair cedo para encontrar Leonel que ficara observando um novo local para se  mudarem. Tudo daria certo, tentou confortá-las.
Não conseguiu dormir. O tempo todo  a cena de Leonel transformando-se em uma planta teimava em se repetir. Tinha vontade de rir e de chorar. Pensava ter enlouquecido. Suspirava muito, levava a mão à cabeça, ao peito. Não entendia o que havia acontecido. Qual era o sentido de tudo aquilo?
Saiu cedo, nada havia pra comer ou  beber. O que mais  doía era saber que as duas ficariam ali naquela situação, com sede, com fome. Não entendia como ainda não tinham morrido, tantos dias naquela situação.  Voltou a casa do chafariz. O sol já a pino aumentando a secura da boca, os lábios já rachados pelo calor.  No pátio, folhagens verdes, árvores viçosas, pássaros de todos os tamanhos cantando e revoando de um arbusto a outro. No centro do terreno, a mulher de mármore apontando para o céu, a água corrente. Sentou se no chão do outro lado da rua e  chorou perguntando a Deus se ele tinha  se esquecido deles.
Um farfalhar sem vento o lembrou de Leonel ali transformado em Buganvília. Naquele pavor não saberia dizer com certeza quem, qual era ele. Eram tantos os pés daquela flor trançando na grade... Ouviu outra vez o barulho destoando nas folhas e reconheceu o amigo. Chegou chorando à cerca e de forma inexplicável, conversaram, sem falar.
Leonel estava consciente, revigorado. Sentia-se muito bem  e pediu a Pedro que comprovasse  sua amizade fazendo-lhe um favor.  Ao ouvir o pedido sacudiu a cabeça, chorou, disse que não conseguiria. Chorando ainda mais desnorteado, cambaleando de sede afastou-se do amigo sem saber o que fazer. No caminho para casa, alongado pela fraqueza, pensava na situação em que estavam e sem forças de continuar  lutando  pensou no pedido do amigo.
Em casa o silencio. As duas estavam desfalecidas. O peito da criança mexia muito leve e devagar, talvez nas últimas horas de vida. Sem pensar mais, sacudiu os braços  de Marta  que abriu os olhos com muito esforço.
- Vamos! – Disse  ele decidido.-  Vamos! Falta pouco agora. – Foi até  Ester, pegou a criança sem vida  nos braços  e falou.
- Leonel nos espera. Vamos! Ele esta bem, encontramos um lugar com água para vivermos!
Sem questionar e com passos curtos e lentos as duas começaram a  caminhada revigoradas pela esperança. O sol já tinha se escondido e o calor diminuíra ajudando no trajeto.

Ao chegarem à casa cercada de buganvílias  uma  mulher  caminhou até o portão e o abriu para eles. Pedro a reconheceu. Era a deusa de pedra do chafariz.

3 comentários:


  1. Tem dias q n consigo entender esse Google,já comentei 2 vezes e nada d publicação dos tais.

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  2. Fantástico.Essa casa bem poderia ser a minha,me vi na descrição,sim,a mulher de pedra certamente sou eu.
    Bouganville,minha planta preferida desde há mto tempo e em todas as colorações existentes.
    Por um momento temi pelas vidas de Pedro,Leonel,suas companheiras e filho,ufa! que maravilha,final inesperado e feliz.
    Amei Sinara Foss, tens a capacidade de inserir o leitor no ambiente em questão,demaissss.
    Adiante amiga.Bjksssssssssss

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    1. Coisa boa!!! Me arrepiei Suzy com seu comentário. Adoro receber um feedback assim positivo sobre meus escritos.

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