Friends are not FOOD

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sábado, 20 de outubro de 2018

Espelho Meu



Salinas despida, de pé em frente ao espelho contempla seus pés, as unhas bem feitas, pintadas com a cor nude. O olhar sobe, fixa nas canelas, nos joelhos, bem depilados; os quadris alargados por duas gravidezes, seus filhos já adolescentes. Leva rapidamente as mãos aos seios. No lado esquerdo uma lacuna, um vazio, uma cicatriz escura riscando a pele. Abaixa a cabeça rápido e dá dois passos para o lado, não quer encarar a imagem refletida. Sente-se violada, mutilada.  Chora.
Seca as lágrimas. Funga o nariz. Põe uma camisola de seda cor clara de rendas e ajeita um lenço na cabeça da mesma cor. Precisa retomar seu casamento abalado pela desconfiança da doença, exames, médicos, descoberta, cirurgia, hospital, quimioterapia, enjoos, queda de cabelos... Sua vida não pode esperar a reconstrução da mama marcada para dali a três meses.
- "Ele ainda sente desejo por mim?"
-" Eu estou bonita?"
-" Como vai ser?"

-"Estamos prontos pra recomeçar?"
O barulho do portão eletrônico avisa que o marido está chegando do serviço. O carro entra no pátio e estaciona na garagem junto à casa. Seu coração perde o compasso.
Respira fundo. Volta para frente do espelho.
- É Hoje! - Sorri, tentando ser confiante, enquanto borrifa perfume em seu pescoço.

2 comentários:

  1. Gostei, já tive na minha família esta situação. Teu conta aborda com bastante objetividade o assunto.

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    1. Obrigada! Felizmente nunca passei por isso. Mas sempre tento me colocar no lugar do meu personagem

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